Cidades

Relatório aponta caos em hospitais de Niterói e SG

Superlotação, falta de profissionais e leitos inutilizados estão entre as principais irregularidades na unidade em Niterói. Foto: Arquivo

Más condições de atendimento, internação e estrutura fizeram com que o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CREMERJ) acionasse a Justiça contra hospitais de São Gonçalo e Niterói. Na tarde desta quinta-feira (16) o Conselho detalhou todas as irregulares encontradas nos hospitais Universitário Antônio Pedro (HUAP) e Doutor Luiz Palmier, além da Unidade de Saúde Familiar de Santa Luzia, que resultou em notificação e até interdições. O Ministério Público e a Defensoria Pública já foram acionados para garantir urgência no cumprimento das exigências considerando a gravidade das denuncias.

Em São Gonçalo, foram fechados, na última terça-feira (14), a Unidade de Saúde Familiar Santa Luzia e o Hospital Doutor Luiz Palmier, que manteve a assistência dos pacientes já internados, restringindo somente novas internações.

Além disso, o Conselho notificou, na última quarta-feira (15), o Hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói, por conta de várias inconformidades, como superlotação, que devem ser corrigidas para evitar interdição.

Cremerj, Hospital, Conselho
Direção do Conselho detalhou as irregularidades encontradas nas unidades. Foto: Ascom CREMERJ

“A interdição ética é uma medida extrema e foi decidida pelo conselho com muita tristeza. Sabemos que há muitos problemas na saúde pública, mas os casos encontrados nestas unidades são graves. Visitamos esses locais algumas vezes, notificamos e os reparos não foram feitos. E nós não podemos ser coniventes com isso. As situações colocam em risco a segurança da população e prejudicam o trabalho médico”, explicou o presidente do Cremerj, Sylvio Provenzano.

Todas as interdições e a notificação ética foram realizadas pelo Departamento de Fiscalização (Def) do Cremerj, composto por médicos fiscais. Em todos os casos, foi emitido um prazo para que as unidades possam se adequar.

De acordo com Luís Guilherme, as unidades interditadas já tinham passado por vistorias anteriores e os problemas apontados aos gestores.

“O CREMERJ cumpre sua missão institucional em defesa da boa prática médica e de proteção à assistência da população. Foi a primeira interdição cautelar em 26 anos. Esta atitude, que é uma exceção, foi necessária para reconstruirmos a gestão e enfrentarmos os antigos problemas que assolam a saúde pública do Rio de Janeiro. Esperamos que as inconformidades sejam reparadas, para que, durante a visita de retorno, essas unidades possam voltar a atender os pacientes com segurança e qualidade”, destacou o diretor.

Hospital Doutor Luiz Palmier

Não há aparelho de radiografia e tomografia no hospital. Foto: Arquivo

A unidade pertence ao Complexo Luiz Palmier e funciona como retaguarda para internação clínica e cirúrgica da emergência do Pronto Socorro Doutor Armando Sá Couto e também para duas UPAs municipais.

A fiscalização, ocorrida em 17 de abril, constatou que, desde a última visita de vistoria do Cremerj na unidade, em outubro de 2018, apenas duas das 15 irregularidades apontadas na época foram normalizadas: o cadastro do diretor técnico no Conselho e a compra de suplementos nutricionais para pacientes.

As inconformidades de maior impacto e gravidade para a assistência médica, no entanto, permanecem, que são: ausência de carrinho de parada cardíaca para as enfermarias nos três pavimentos de internação; ausência de materiais e equipamentos indispensáveis para o funcionamento da unidade de terapia semi-intensiva (unidade intermediária); falta de rouparia em todo o hospital; e questões gerais de segurança.

Durante a vistoria, foi verificado, ainda, que dos sete leitos da unidade intermediária, apenas cinco estão funcionando devido a problemas estruturais. Dos cinco pacientes, dois estavam em ventilação mecânica, ou seja, com perfil de paciente para unidade de terapia intensiva. Dos seis ventiladores mecânicos, apenas quatro estavam funcionando e dois tinham sido encaminhados para conserto. Nenhum paciente possuía pulseira de identificação e também não havia identificação de riscos no leito.

Não há aparelho de radiografia e tomografia no hospital. Os pacientes que precisam desses exames são levados de ambulância para outra unidade. Informaram ao Defis que os exames costumam ficar sem laudo, devido à falta de radiologistas. Para as tomografias, o parecer é entregue 15 dias após o exame, o que atrasa o diagnóstico e o tratamento dos pacientes internados. Também não há serviço de radiografia e ultrassonografia móvel para suporte da UTI semi-intensiva.

Segundo os fiscais, a unidade não tem boas condições de higiene e limpeza e as instalações elétricas não estão compatíveis com as normas de segurança. Há problemas estruturais e na sinalização dos acessos. Além disso, a única ambulância do hospital está sucateada. Quando há necessidade de transferência de paciente grave é solicitado o auxílio do SAMU. Nas enfermarias, o Defis constatou que todos os pacientes internados usavam roupas de cama trazidas da própria residência, sem o controle de higienização, o que aumenta o risco de infecção hospitalar. Nem todas as enfermarias tinham banheiros e as menores compartilhavam toaletes no corredor. As condições de higiene eram ruins e havia muita desorganização nos setores.

Dois pacientes internados em longa permanência – 520 e 228 dias – nas enfermarias estavam ao lado de outros diagnosticados com patologias infecciosas. Ambos estão em local sem estrutura para reabilitação, recreação, interação social e cuidados que seus estados de saúde exigem. Os extintores de incêndio permanecem desabastecidos desde 2016 e muitos deles estavam em locais não sinalizados e obstruídos, o que dificulta a utilização em situações de incêndio e pânico.

A direção informou aos fiscais a dificuldade para transferência de pacientes de média e alta complexidade pelo Sistema de Regulação Estadual (SER), com destaque para aqueles pacientes que necessitam de cirurgia vascular e de cirurgias e procedimentos cardiológicos.

USF Santa Luzia

Na Unidade de Saúde da Família de Santa Luzia, em São Gonçalo, os fiscais verificaram, em 17 de abril, que desde a última visita de fiscalização do CREMERJ, realizada em janeiro, a unidade não regularizou os itens indicados ou apresentou plano de reestruturação.

A infraestrutura precária da unidade, aliada à falta de material de conservação, higiene e insumos médicos impactam diretamente na assistência médica prestada pela unidade, colocando em risco o ato médico exercido naquele local. Os fiscais verificaram que a unidade está cadastrada junto ao CREMERJ, porém funcionando sem diretor técnico registrado e com certidão desatualizada. Foi evidenciada a deficiência de agentes comunitários de saúde com a presença de áreas descobertas.

Após análise de algumas fichas de atendimento, foi possível constatar que alguns documentos não tinham informações compreensíveis, com difícil entendimento da historia clínica do paciente e não tinham o devido registro do médico responsável. A unidade enfrenta dificuldade na disponibilização de material impresso, como folhas de receituários. Foi constatado que a própria equipe realiza a compra do material com recursos pessoais de forma rotineira. Ao analisar a infraestrutura da unidade, é notório que a mesma não funciona em local adequado. O espaço foi transformado a partir de um imóvel residencial, sem o planejamento correto. A área destinada à copa, por exemplo, é compartilhada com a recepção dos pacientes. A unidade conta com dois consultórios médicos, em um deles a porta não podia ser fechada da maneira correta porque a fechadura estava quebrada.

O PSF não está adaptado para receber pacientes portadores de alguma deficiência e não dispõe de sala de pré-consulta da enfermagem.

Hospital Universitário Antônio Pedro

Vistoriado em 20 de março, o Cremerj constatou várias inconformidades no Hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói. A emergência, por exemplo, que foi referenciada em 2008, estava superlotada, com pacientes internados no corredor. A unidade não conta com setor de acolhimento e classificação de risco, contrariando as Resoluções CFM 2077 e 2079/2014 e o que é preconizado pelo Ministério da Saúde. Além disso, foi constatada falta de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem.

Em relação aos pacientes com câncer, não há suporte para a realização de cuidados paliativos. O serviço de oncologia não conta com enfermaria específica e acaba usando leitos da emergência e de outras clínicas especializadas, que também sofrem com a superlotação. Já a unidade semi-intensiva do Antônio Pedro funciona, na prática, como um CTI, devido à complexidade dos pacientes internados – muitos deles sob ventilação mecânica.

Apesar da gravidade dos casos, o setor permanece sem médico exclusivo, contrariando a Resolução Cremerj nº 109/1996 e a RDC ANVISA nº 07/2010. Ainda sobre recursos humanos, outro problema é a ausência de médico rotina aos finais de semana. Enquanto a unidade semi-intensiva funciona de forma improvisada, o CTI conta com dez leitos ativos, apesar de ter 16. O bloqueio de leitos também foi verificado em outros serviços do hospital, o que mostra a gravidade da situação, já que, de acordo com o relatório do Defis, pacientes, inclusive da própria emergência do Antônio Pedro, aguardam transferência para vagas de internação, podendo até mesmo agravar seus quadros de saúde por conta desta demora.

Por conta de tantas inconformidades, o Cremerj esteve na unidade nesta quarta-feira, 15, para entregar uma notificação à direção geral do hospital, para que as providências sejam tomadas o mais rápido possível. O conselho também encaminhou cópias do documento para a Defensoria Pública da União e o Ministério Público Federal.

A direção do Huap esclareceu que o setor de emergência "atende somente a demanda de pacientes clínicos ou cirúrgicos do ambulatório do próprio hospital, que tiveram sua situação agravada e necessitam da assistência necessária para o restabelecimento de sua saúde". Esse modelo foi definido em conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde de Niterói.

A superlotação do setor, verificada pelo Conselho, é reflexo da carência de leitos clínicos para longas permanências - quadro enfrentado pela rede estadual e nacional de saúde, frisa a direção.

A constação da presença de paciente nos "corredores" da unidade por parte da Cremerj, segundo a direção, foi equivocada. O espaço relatado é "estruturado e climatizado para receber o excedente de pacientes que são encaminhados dos ambulatórios da própria unidade".

Ademais, o Huap afirma de coopera com o Conselhor e que pleiteia a convocação imediata de profissionais de saúde para ativar todos os leitos hospitalares.

SG considera interdição desproporcional

Em resposta as interdições nas unidades de São Gonçalo, a Prefeitura esclareceu que segundo a direção do Hospital Luiz Palmier, a interdição é desproporcional a realidade atual da unidade de média e alta complexidade e prejudicial aos usuários do Sistema Único de Saúde. Como a interdição é parcial, a unidade, que atua com leitos de retaguarda a 3 unidades hospitalares de urgência e emergência da cidade, continua realizando toda assistência necessária aos pacientes já internados, prestando todo suporte normalmente. 

Informa ainda, que a unidade respondeu o ofício previamente ao Cremerj, com as adequações solicitadas na última visita e que as não solucionadas se encontram em processo licitatório de compras.

Com relação à USF Santa Luzia, a Subsecretaria de Atenção Básica informa que os atendimentos médicos foram remanejados para outra unidade próxima, porém os demais atendimentos estão sendo realizados. 

Na quarta-feira (15), foram realizados atendimentos de enfermagem, fonoaudiologia, vacina, curativo e atendimento em pré-natal para gestantes. 

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