Relacionamentos

Dependência emocional: entenda tema abordado na novela 'Vai na Fé'

Saiba o que fazer caso você viva uma situação do tipo

As novelas têm o costume de debater temas importantes para a sociedade
As novelas têm o costume de debater temas importantes para a sociedade |  Foto: Reprodução/TV Globo
 

Um tema tem ganhado as redes sociais nos últimos dias graças à novela "Vai na Fé", da TV Globo: a dependência emocional. As personagens de Carolina Dieckmann e de Regiane Alves, respectivamente Lumiar e Clara, já demonstraram diversas vezes que os relacionamentos (ou casamentos) são o centro da vida delas. Mesmo com os cônjuges, respectivamente Ben e Theo, demonstrando que não querem prosseguir na relação ou até mesmo traindo elas, as duas tentam, de toda forma, contornar a situação e lutar para que elas voltem a ter esse relacionamento, preferindo estarem acompanhadas de homens que não as querem ou não as respeitam, do que estarem sozinhas. Por causa disso, o ENFOCO resolveu ouvir pessoas que já foram dependentes emocionais e até mesmo uma terapeuta para debater sobre esse tema importante na atualidade.

Um relacionamento no qual uma pessoa é dependente emocional pode ocorrer por vários motivos. É importante entender que não há culpa em uma situação como essa, mas é possível que as pessoas se tratem na terapia até para que ela entenda que seu relacionamento é apenas um adicional em sua vida e não o seu mundo inteiro.

A aposentada Sandra Pestana, de 64 anos, passou oito anos vivendo um relacionamento abusivo que incluía dependência emocional. Ela conheceu o parceiro enquanto trabalhava e, na época, ela namorava outra pessoa, portanto, demorou alguns meses para que os dois se envolvessem para além da amizade. Eles começaram a se relacionar romanticamente em 2005 e ficaram até 2013. Durante a relação, Sandra sabia que estava sofrendo de dependência emocional, mas, mesmo assim, ela não conseguia sair da situação. 

“Na nossa rotina, a gente mal se encontrava. Ele vivia na rua e chegava em casa para brigar e dormir. Ele não era muito participativo nas tarefas domésticas e trocava o dia pela noite. Então, enquanto eu trabalhava no dia a dia, ele estava dormindo e de noite ele acordava e eu dormia. Eu percebi que era dependente emocional porque a gente só vivia brigando, ele me maltratava e eu terminava, mas acabava voltando por gostar dele. Eu queria sair dessa relação, mas ele vinha e acabava me manipulando um pouco e voltávamos.  Ficou nisso durante todos os anos em que estivemos juntos”, disse ela. 

Até que em uma briga, os dois terminaram de vez e ela pediu que o parceiro fosse embora da casa, que era dela. Ele ainda tentou voltar com ela algumas vezes, mas, com o apoio da família, Sandra preferiu não voltar.

“Eu cheguei a me afastar dos amigos por pedido dele, passei a ficar muito sozinha. Não quero me relacionar mais com ninguém assim. Dou um conselho para que quem esteja passando por isso que saía fora o mais rápido possível e viva sua vida. A liberdade não tem preço. Eu acho importante as novelas abordarem isso, como a 'Vai na Fé', o que o Theo faz com a mulher dele… ele engana ela e depois a joga na cama e ela não consegue sair. A relação de Lumier e Ben também mostra que ela é dependente emocional dele. Acho importante passar na televisão, mas pode ser arriscado para as crianças, para nós é bom, mas depende da idade”, afirmou ela.

É importante destacar que não é porque há dependência emocional que uma relação se torna abusiva, as duas coisas são muito diferentes. Ou seja, uma pessoa dependente emocional não necessariamente vive uma relação abusiva, como foi o caso de Sandra com ofensas e exclusão da pessoa da sociedade.

É o caso da estudante de Turismo Rosa Borges, de 25 anos. Ela conheceu um rapaz em um aplicativo de relacionamento em 2018 e viveu um relacionamento de dependência emocional por dois anos com ele. Eles não moravam juntos, mas um conheceu a família do outro. Ela terminou a relação quando percebeu o que vivia e que a relação favorecia mais ele. A terapia a ajudou perceber a dependência. 

“Nós nos víamos toda semana, mas ele sempre tinha um compromisso depois de ir me ver, ou vira e mexe cancelava os nossos encontros de última hora. Percebi que vivia essa situação através de terapia. Comecei a expor meus sentimentos e problemas para um profissional de Psicologia e isso me ajudou a chegar a essa conclusão. Foi a partir daí também que me livrei dessa situação, focando mais em mim, procurando me ocupar com coisas novas e que eu gostava, me redescobrindo e aprendendo a ficar bem na minha própria companhia. 

Na época, ela conta que se sentia culpada e vulnerável por viver uma situação como essa, mas hoje entende que era vítima de inseguranças dela mesma e da outra pessoa. Com a terapia, ela tenta evitar de se colocar em situações como essa novamente e aconselha.

“Saiba impor os seus limites e faça com que você e as outras pessoas os respeitem. Assim você vai estar no controle sobre o que pode ou não ser sujeitado. E escolha sempre estar de bem consigo mesma e, caso precise, aceite e busque ajuda profissional ou de um amigo ou parente próximo a você”, disse ela que enfatiza que é importante ter “pautas como essa nos meios de comunicação e cultura, como na novela, pois assim podemos ajudar alguém a identificar os sinais desse tipo de situação a procurar ajuda e também mostrar que não se deve julgar quem passa por isso, já que todos, em algum momento, podem estar suscetível a depender emocionalmente, independente da situação”.

dicas importantes

A psicóloga Sandra Isensee Torres, que atua na profissão há 30 anos, explicou um pouco sobre a dependência emocional. 

“Dentro do ponto de vista psicanalítico, o dependente emocional é aquele que não deixa o seu desejo vigorar. A pessoa vive sujeitada ao outro, ela vive mais como objeto do que desejo, porque quando uma pessoa deixa o seu desejo vigorar, ela, com certeza, vive num equilíbrio entre razão e emoção. Claro que razão e emoção se entrelaçam o tempo inteiro, mas a pessoa consegue manter esse equilíbrio e vigora, deixa vigorar o seu desejo, já a pessoa insegura não deixa isso acontecer, ela vira objeto do outro, o outro que determina e esse outro pode estar errado, mas como a pessoa está insegura ela vira objeto dele. Essa dependência emocional pode ocorrer em relações amorosas, na vida profissional, na vida social… Tem pessoas com transtornos que dependem do outro para se sentir completo e vivo, como o borderline”, disse ela. 

Alguns dos sinais que alguém vive uma dependência emocional é a insegurança, a falta de autoestima e de autoconfiança, quando se busca a aprovação no outro e a pessoa busca o tempo todo entender o que representa para o outro por causa da carência.

Ela ressalta a diferença entre a dependência emocional e o relacionamento abusivo. “A relação é abusiva é aquela que chamamos de tóxica, é quando machuca, falta respeito, falta tudo, existe perversidade, falta de respeito, é aquela pessoa que não aceita o outro como ele é, quando não existe uma relação de vamos lidar com as nossas diferenças, tem que ser como o outro quer o tempo inteiro, com agressões até com palavras, não deixando o outro ter voz. As pessoas podem permanecer em relações abusivas por medo, por questões financeiras, mas também pela dependência emocional sim”, disse ela. 

A psicóloga ainda dá dicas para quem se percebe como dependente emocional e como sair dessa situação. “Para sair dessa, a pessoa tem que entender que vive em dependência emocionalmente do outro, quando ela tem consciência, como dizemos na neurociência, quando você entende sua personalidade e que você tem tendência a não vigorar com autonomia no mundo, você tem chance de mudar. Numa relação amorosa, depende de muitas coisas, se está casado e com filho tem que ver como sair dessa, mas nada deve ser visto como uma sentença, temos que ter solução, o que não podemos é permitir que o outro abuse, porque o abusador percebe a fraqueza do outro. Quando se está fora de um casamento, as pessoas podem achar que não conseguem ficar sozinhas e, por isso, não saem. O importante, para mim, é você ter autoconhecimento que permite que você tenha liberdade de ser e isso, muitas vezes, com a terapia. Não se deve ter pressa para entrar num relacionamento também, ninguém conhece também, tem que encontrar, namorar e ir com calma. A pessoa tem que lembrar também que tem cérebro, usar a racionalidade, e entender o que é estar num relacionamento, entender quem é o outro, se conhecer, entender como a pessoa vê as coisas ao redor”, contou ela.

A carência e a infância são alguns dos motivos pelos quais alguém pode ser carente emocional. “A criança que teve amor, foi construindo sua autoestima, está preparada para a vida, para enfrentar qualquer relacionamento, mas a carência daquela pessoa que não teve amor e depende do outro, que acha que ficar sozinho é sofrer de solidão, qualquer um que aparecer tá bom contato que ela não lide com aquilo que ela tem medo. Quem gosta da sua própria companhia não tem esse problema, a hora que aparecer alguém que ela gosta ok, mas não por medo, para fugir de si mesma, da sua companhia. Relacionamento saudável não quer dizer que não tem discussão, mas as pessoas conseguem sentar e resolver suas diferenças. Tem amor, companheirismo e respeito, lidando com as coisas fáceis e difíceis ”, diz ela.

Ela não assiste a novela Vai na Fé mas, percebe, que outras novelas abordam diversos assuntos que estão na atualidade, como a inteligência artificial. Ela acredita que sim, é importante abordar esse tema, mas de forma inteligente e, assim como Sandra Pestana, acredita que não para as crianças, que devem assistir TV com fiscalização dos pais.

Na internet, os fãs da novela seguem torcendo para que as personagens em questão percebam que vivem uma dependência emocional e que, ao final, consigam se livrar disso e seguirem suas vidas de forma mais leve e saudável.

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