Odetinha

À espera de um milagre: carioca pode ser primeira santa do Rio

Vaticano já reconheceu as virtudes heroicas da menina

Padre João Cláudio fez o trabalho de pesquisa sobre a vida e virtudes da pequena
Padre João Cláudio fez o trabalho de pesquisa sobre a vida e virtudes da pequena |  Foto: Marcelo Eugênio

O estado do Rio pode estar próximo de ganhar sua primeira santa. Isso porque o Papa Francisco promulgou o decreto que reconhece as chamadas virtudes heroicas da carioca Odette Vidal Cardoso, popularmente conhecida como Odetinha, que morreu aos 9 anos, no final nos anos 1930. Este é o segundo nível do processo de canonização para se tornar santa. Todo o trabalho de pesquisa sobre a vida e virtudes da pequena foi conduzido pelo padre niteroiense João Cláudio Loureiro do Nascimento. 

O processo para virar santo possui quatro partes e pode levar décadas para ser aprovado pelo Vaticano. Mas também pode ser rápido, não há como prever uma estimativa de tempo, como explica João Cláudio, pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Niterói. Agora, o próximo passo é a beatificação, quando houver um milagre atribuído à intercessão daquele venerável, que seja reconhecido pelo Vaticano.

"Só passa a ser milagre quando a ciência não consegue explicar. Quando os cientistas e médicos declaram que não têm como explicar, e o Vaticano usa só ateus para fazer isso. Uma junta de médicos que são ateus declaram que não têm como explicar pela ciência o que aconteceu, aí o Vaticano fala: 'Isso aqui foi um milagre!'", explica João Cláudio.

O processo de beatificação da ''carioquinha celeste'' teve início em 2022, mas o padre João Cláudio acredita que as avaliações não vão demorar tanto para chegar na fase final.

Acredito que vá durar uns quatro anos para sair a beatificação e em cinco ou seis anos acho que ela é canonizada. Até porque eu acredito que o Papa vá dispensar o segundo milagre, ela era uma criança, já está canonizada no coração do povo João Cláudio Loureiro, padre

Pequena mística

Odetinha foi diagnosticada com tifo em 1° de outubro de 1939
Odetinha foi diagnosticada com tifo em 1° de outubro de 1939 |  Foto: Acervo

Odetinha nasceu em Madureira, na Zona Norte do Rio, em 18 de fevereiro de 1931. A mãe dela, Alice Vidal, ficou viúva ainda grávida, quando o marido Augusto Ferreira Cardoso, morreu de tuberculose. Logo depois, a mulher se casou com Francisco Oliveira, empresário bem sucedido na época, que acolheu a menina como pai. 

Odetinha comparecia diariamente à missa e, todas as noites, unia-se à sua família para rezar o terço. Sua dedicação à caridade a levava a auxiliar àqueles que mais necessitavam, destacando-se por, com auxílio da mãe, preparar uma feijoada semanal que era oferecida aos menos privilegiados.

Desde os seus 5 anos de idade, iniciou sua participação no catecismo no Colégio São Marcelo, vinculado à Paróquia Imaculada Conceição, em Botafogo, Zona Sul do Rio. O padre Alfonso prontamente reconheceu a "notável maturidade" de Odetinha em sua fé e consentiu que ela fizesse a primeira comunhão em 15 de agosto de 1937.

Odetinha foi diagnosticada com tifo em 1° de outubro de 1939. Foram 49 dias de sofrimento no qual, mesmo em leito, a pequena demonstrava uma força 'fora do comum'. Durante esse tempo, ela recebeu a Sagrada Comunhão, os sacramentos do Crisma e a Unção dos Enfermos.

A carioquinha celeste morreu em 25 de novembro de 1939 e seu corpo foi enterrado no Cemitério São João Batista, em Botafogo, bairro que morou a vida toda. Estima-se que, ao todo, mais de 50 mil pessoas já visitaram o jazigo para agradecer pelas graças ou pedir sua intercessão. 

"Quem visita os túmulos e reconhece a santidade é o povo! A Odetinha, no coração do povo, já é santa há muito tempo. Desde que ela morreu, a morte dela causou uma comoção lá em 1939, para as pessoas do bairro de Botafogo, para escola em que ela estudava, e, assim, começou as visitas aos túmulos. Ela se transformou no segundo túmulo mais visitado do Cemitério São João Batista", destaca o padre.

Etapas para virar santo

  1. Servo de Deus: esta é a fase inicial. Após a morte do candidato, um processo é iniciado para coletar e documentar todas as informações relevantes sobre a vida e as virtudes do indivíduo. Isso inclui testemunhos, escritos e qualquer evidência de uma vida de santidade. Um postulador é nomeado para supervisionar esse processo.
  2. Venerável: após a compilação dos documentos, o caso é apresentado à Congregação para as Causas dos Santos, que analisa a vida do candidato e decide se ele pode ser considerado "venerável". Isso significa que a pessoa viveu uma vida de virtude heróica, exemplificando os ensinamentos cristãos.
  3. Beatificação: para ser beatificado, um milagre atribuído à intercessão do venerável é necessário. Esse milagre deve ser avaliado por médicos e peritos, para assegurar que não tenha explicação científica. Após a aprovação, o Papa pode declarar o indivíduo como "beato", permitindo que ele seja venerado em um nível local.
  4. Canonização: a canonização exige um segundo milagre, também avaliado quanto à sua autenticidade. A Congregação para as Causas dos Santos analisa novamente o caso e, se aprovado, o Papa pode proclamar o indivíduo como santo. Isso significa que ele pode ser venerado em toda a Igreja Católica.

Padre niteroiense

Padre escreveu um livro relatando a história de Odetinha
Padre escreveu um livro relatando a história de Odetinha |  Foto: Marcelo Eugênio

Nascido em Niterói, João Cláudio, de 48 anos, é padre desde os 24. Mestre em Teologia e Direito Canônico, ele foi nomeado presidente da comissão histórica do processo de beatificação de Odetinha, a partir do convite de dom Roberto Lopes, responsável pela Causa dos Santos da Arquidiocese do Rio.

Ele conta que tudo começou em 2011, quando a cidade foi escolhida para sediar a Jornada Mundial da Juventude, em 2013. Dom Orani, então, pediu referências de santidades cariocas.

"Eles começaram a perceber que no Rio tinham vários jovens que viveram a santidade, como o caso do Guido, da Odetinha, do casal Zélia e Jerônimo. Então criou-se um escritório para se fazer os estudos de processos de beatificação e canonização. Eu era amigo do atual responsável, dom Roberto Lopes", relembra.

No Rio, outros três indivíduos estão, atualmente, passando pelo processo estabelecido pela Igreja Católica e podem ser elevados à santidade nos próximos anos: o casal Zélia, originária de Niterói, e Jerônimo, natural de Magé, além do Guido Schäffer, nascido em Volta Redonda, mas que passou a maior parte de sua vida em Copacabana.

Até então, o padre niteroiense não tinha ouvido falar na Odetinha. "Isso também é bom, porque pude fazer um trabalho bem independente. Eu não conhecia nenhum candidato do Rio, até porque eu sou de Niterói. Então eu poderia trabalhar em cima disso com muita tranquilidade. Eu comecei no casal, mas em fevereiro de 2012, Dom Roberto me pediu para ir para Odetinha, e aí eu fui".

Foi então que um intenso trabalho de pesquisa teve início, reunindo milhares de documentos, que foi enviado para o Vaticano em 2014 e aprovado. Agora, na segunda fase, Odetinha é a mais próxima carioca a estar perto do título de santidade.

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