'Escritório do crime'

Ex-funcionária revela como funciona golpe do falso empréstimo em SG

Prática vem crescendo entre quadrilhas que lesam idosos

Segundo denunciante, funcionários têm meta de faturamento  mensal
Segundo denunciante, funcionários têm meta de faturamento mensal |  Foto: Reprodução
 

Uma ex-funcionária de um dos escritórios do falso empréstimo instalados em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, deu detalhes, com exclusividade ao ENFOCO, de como é o esquema criminoso. Segundo ela, cada um dos 15 funcionários onde atuou por apenas 20 dias tinha como meta faturar mais de R$ 50 mil por mês, que recebiam também 2% no lucro total mensal da "empresa", como bônus. Ela não soube revelar, no entanto, o valor mensal arrecadado pelo empreendimento ilegal.

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A jovem, que não foi identificada por questões de segurança, somente percebeu que o local era um escritório do crime poucos dias depois que foi contratada. Mas imediatamente após isso, ela pediu para se desligar. Ainda segundo a mulher, durante o tempo em que trabalhou para os criminosos, cerca de 10 pessoas caíam no golpe diariamente. 

"Eu estava desempregada e fiquei sabendo da vaga de emprego através da indicação de uma amiga que já trabalhava nessa área como gerente. Eles também anunciam  as vagas em sites. A vaga era para vendedora. Apesar disso, no dia da entrevista, eles não explicaram muito bem o que era para ser feito. Eles dão uma explicação básica para não alertar sobre a fraude, ou seja, dizem apenas que o trabalho é ligar para a pessoa e oferecer o empréstimo. Eu já saí da entrevista empregada", contou.

Ela foi contratada com a finalidade de realizar supostos cancelamentos de empréstimos consignados existentes no "escritório". Apesar da "empresa" assinar a carteira de trabalho, ela preferiu não ter a o documento assinado após desconfiar das atividades ilícitas realizadas no local. 

"Comecei a desconfiar porque quando conseguia fechar um cancelamento, o atendimento era passado para outro setor no qual uma pessoa mais experiente dava continuidade. O cliente mandava imagens do seu perfil e do documento, pensando que estava cancelando o empréstimo, mas na verdade estava sendo feito outro empréstimo no nome dele", revelou a ex-funcionária. 

Segundo ela, existem diferentes formas de oferecer os serviços do escritório do crime para as vítimas. O esquema é realizado em setores diferenciados.

"Tem o oferecimento de um novo empréstimo, redução de juros ou cancelamento do que já existe. Cada setor faz uma área, mas a finalidade é a mesma", explicou.

Sobre os chefes da organização, ela explicou ainda que não os conheceu e que também se arrependeu de ter trabalhado para os criminosos, mesmo que de forma enganada e por pouco tempo. 

"O fluxo de funcionários é muito grande. Muitos conseguem bater a meta, eu nunca consegui. Lá no prédio onde trabalhei existem vários escritórios desses. Os donos não ficam lá, quem fica são pessoas de confiança que recrutam os funcionários", detalhou a mulher que não denunciou a suposta empresa por medo de represálias. 

Na mira da polícia

Delegado da 72ª DP  está investigando líderes dos 'call centers' do crime
Delegado da 72ª DP está investigando líderes dos 'call centers' do crime |  Foto: Marcelo Tavares
 

Apesar dos "patrões" não comparecerem aos “escritórios do crime” como revelou a denunciante, alguns deles já estão na mira da polícia. O delegado Márcio Esteves, titular da 72ª DP (Mutuá), investiga três pessoas, entre elas, um casal que é dono de vários "call centers", e muitos deles já foram até fechados pelos agentes. O casal tem uma movimentação milionária, segundo a polícia. 

Pela quantidade que a gente vê durante o monitoramento, esse pessoal deve tirar quase R$ 1 milhão por mês. Um ator principal aluga o espaço e monta um call center, com vários computadores ligados ao programa chamado vanguard que capta os clientes” Márcio Esteves, Titular da 72 DP (Mutuá)
 

ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO 

Ainda de acordo com o delegado, por conta das ações realizadas contra os escritórios, parte da quadrilha passou a se associar ao tráfico de drogas. Alguns escritórios deixaram de funcionar em locais comerciais para agir dentro das comunidades, com a proteção de traficantes dificultando a chegada dos policiais aos locais. 

"Temos conhecimento que como começamos a atuar fortemente nesses escritórios, eles se associaram ao tráfico de drogas para obter uma proteção. Pagam uma mensalidade aos traficantes instruindo para o interior das comunidades. Inclusive, já conseguimos estourar um escritório na comunidade Menino de Deus”, disse.

CAIU NO GOLPE? SAIBA O QUE FAZER 

Advogado John Wesley dá dicas importantes
Advogado John Wesley dá dicas importantes |  Foto: Marcelo Tavares
  
Se caiu no golpe como "cliente" ou foi contratado para trabalhar sem saber para a prática criminosa, fique atento. O advogado criminalista John Wesley Araújo de Sá dá algumas dicas importantes.
 

"A princípio, as pessoas que estão sendo contratadas para praticar uma atividade desconhecida devem procurar orientação profissional para saber do que se trata, sendo emprego ou qualquer contrato. Mas se ela não fez iss, começou a trabalhar e percebeu que não era uma atividade lícita, automaticamente tem que sair daquele local, procurar uma orientação profissional e uma delegacia  para se resguardar. Os possíveis clientes também devem procurar uma orientação profissional antes de fechar qualquer negócio por ligação telefônica ou rede social", detalhou o advogado. 

Segundo dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), durante a pandemia de covid-19 houve um aumento no número de empréstimos realizados no Brasil, mas muitos acabaram caindo em golpes. Em 2021, o aumento nesse tipo de crime chegou a 60%, e o golpe vem crescendo a cada dia. Os principais alvos da prática continuaram sendo os aposentados e pensionistas do INSS.

Denúncias podem ser feitas pela central do Disque-Denúncia no telefone (21) 2253-1177.

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