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Sem respeito à fé: ISP revela dados alarmantes no estado do Rio

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|  Foto: Mais de três casos de intolerância religiosa foram registrados por dia no estado do Rio em 2020. Foto: Pedro Conforte
Mais de três casos de intolerância religiosa foram registrados por dia no estado do Rio em 2020. Foto: Pedro Conforte

No Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, celebrado nesta quinta-feira (21), o Instituto de Segurança Pública (ISP) revela que em 2020 as delegacias da Secretaria de Polícia Civil no estado do Rio fizeram 1.355 registros de ocorrência de crimes que podem estar relacionados à intolerância religiosa.

O dado alarmante mostra que foram mais de três casos por dia. Nesse contexto se incluem ainda os casos de injúria por preconceito (1.188 vítimas); e preconceito de raça, cor, religião, etnia e procedência nacional (144).

E o pior: os números são ainda superiores, conforme garante a Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos de Raça, Cor, Etnia, Religião, LGBTfobia e Procedência Nacional (Ceplir) da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), que acolhe vítimas presencialmente, com posterior encaminhamento para a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi).

Um gráfico elaborado pela Ceplir com dados coletados de setembro de 2019 a novembro de 2020, ao qual o Plantão Enfoco teve acesso, mostra uma lista de cidades que tiveram terreiros atacados e expulsos especificamente pelo tráfico nesta temporada, sendo apenas um recorte dos crimes cometidos. Ou seja, estando de fora outros tipos de público criminoso.

  • Duque de Caixas registrou 97 casos e Nova Iguaçu, 12. Ambas as cidades ficam na Baixada Fluminense;
  • No interior do estado, Campos dos Goytacazes teve 58 registros;
  • Já na Região Metropolitana, São Gonçalo aparece com 10 casos.

Os dados acima são embasados também pelas Subsecretarias de Assistência Social e Direitos Humanos de Nova Iguaçu e Duque de Caxias.

Fonte: Prefeituras de Nova Iguaçu, Duque de Caxias e Ceplir

"Quando a vítima vai para a delegacia fazer a ocorrência, às vezes o delegado de plantão não tipifica o crime na lei de intolerância e coloca como 'outros'. Quando isso chega no ISP, não é tipificado como intolerância religiosa. Hoje digo que essa é a nossa maior luta: fazer com que as delegacias tenham um entendimento da tipificação"

Lohama Machado, coordenadora da Comissão das Discriminações da Alerj

Igualdade

Em casos de intolerância, a sugestão é o registro minucioso da motivação na ocorrência policial. Foto: Agência Brasil

Em Niterói, a Coordenadoria de Defesa dos Direitos Difusos e Enfrentamento à Intolerância Religiosa – CODIR relata que há um 'oásis', no comparativo a cidades vizinhas. Ao longo de 2020, os atendimentos no município foram voltados, em ampla maioria, para pessoas que desejavam legalizar as suas casas de santo.

"A gente tem uma lei no município que garante isenção de IPTU. Os pais de santo vieram buscar atendimento jurídico para criar estatuto, conselho fiscal e entrar com pedido de formalização dos seus templos religiosos. A gente dá orientação para casos de intolerância, mas fomos mais acessados para formalização", explicou a subsecretária da CODIR, Priscila dos Santos.

O espaço realiza atendimentos todas as sextas-feiras, às 10h, com horário marcado, por conta da pandemia de Covid-19. A CODIR fica na Rua Almirante Teffé, 632, sobreloja. O telefone de contato é o: (21) 2620-3670. O suporte é válido para qualquer denominação religiosa.

Priscila lamentou os dados ao redor do estado e considera ser 'assustador' que as pessoas tenham o direito da fé negado, destacando ainda o fator da pandemia e a quarentena.

"Se formos pensar que foi um período de quarentena, onde as pessoas ficaram isoladas. É bem assustador em pleno século XXI ter o direito da sua fé negado. Temos uma ascendência do discurso de ódio que está no governo central e em vários espaços"

No último ano, foram contabilizados 23 casos de ataque a culto religioso em todo o estado do Rio de Janeiro. A tipificação criminal é determinada pela ridicularização pública, impedimento ou perturbação de cerimônia religiosa. O número é um pouco menor que o de 2019, ano pré-pandemia do coronavírus, em que 32 casos foram registrados, diz o ISP.

Preconceito

A injúria por preconceito é o ato de discriminar um indivíduo em razão da raça, cor, etnia, religião ou origem. Já o preconceito de raça, cor, religião, etnia e procedência nacional tem por objetivo a inferiorização de todo um grupo étnico-racial e atinge a dignidade humana. O ISP reconhece ainda que esses crimes são, comumente, subnotificados.

"Esses números do ISP, por mais que sejam bem maiores, o dado reduzido apresentado é um número alto, tendo em vista um ano completamente atípico. Quer dizer: se num ano atípico tivemos mais de 3 casos de intolerância por dia, imagine em um ano aonde todos os órgãos funcionam normalmente?"

Lohama Machado

Em dezembro de 2020, o ISP lançou o Dossiê Crimes Raciais, que foi o primeiro estudo produzido por um órgão governamental em todo o Brasil, com o intuito de analisar e evidenciar os crimes de injúria por preconceito e crimes de injúria com motivação racial. O trabalho mostrou que, em 2019, 844 pessoas foram vítimas de discriminação racial no estado do Rio de Janeiro, sendo 766 delas negras. Isso quer dizer que duas pessoas sofreram racismo por dia.

Como denunciar

Os crimes de injúria racial, ultraje a culto e racismo podem ser denunciados em qualquer delegacia. O estado do Rio de Janeiro conta ainda com a Delegacia de Combate a Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), citada na reportagem, que é especializada no atendimento de vítimas de racismo, homofobia e intolerância religiosa.

A unidade funciona no Centro do Rio (Rua do Lavradio, nº 155). Os registros também podem ser feitos pela Delegacia Online da Secretaria de Estado de Polícia Civil (https://dedic.pcivil.rj.gov.br/).

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